A Boneca do Amor (Ernst Lubitsch, 1919)

Comédia filmada em 1919 na Alemanha, com a qual Ernst Lubitsch já revelava as qualidades subversivas que o consagraram em sua fase de maturidade. The Doll mergulha no imaginário das fábulas infantis para virar o gênero do avesso. O protagonista é um jovem aristocrata a quem é imposta a necessidade de se casar para receber uma herança. Fugindo de um bando de garotas ensandecidas, refugia-se em um monastério e é convencido pelos monges a forjar o casamento com uma boneca, apenas para ficar com a pequena fortuna. O jovem aceita o desafio e, é claro, o plano não sai conforme o esperado, já que a boneca com a qual irá se casar é na verdade uma mulher disfarçada.

É um filme em que as personagens e os signos recusam um padrão tradicional de moralidade, o que, somado à recusa ao realismo na encenação, constrói ao mesmo tempo a epítome e a subversão da fábula de bonecas. No plano de abertura, o próprio Lubitsch é filmado manipulando uma caixa de brinquedos, de onde retira vários objetos para montar, à frente da câmera, o cenário da primeira cena que assistiremos. Ao revelar nesta abertura o caráter artificial da encenação, o diretor reforça sua condição de metteur en scène de uma casa de bonecas, manipulando brinquedos a seu bel-prazer para narrar a história. Não uma história qualquer, e sim uma na qual não são as bonecas que representam figuras humanas, mas o contrário, com a personagem de Ossi Oswalda assimilando um papel de desumanização da esposa e interpretando uma espécie de sex doll em um filme do início do século XX.

Já seria o suficiente para apimentar a fábula, mas Lubitsch salpica a história com outras personagens célebres: os monges gananciosos que sonham com orgias gastronômicas; o fabricante de bonecas que constrói uma esposa falsa à imagem e semelhança da própria filha; a criança tarada, violenta e suicida que flerta com a boneca e conversa diretamente com o espectador, quebrando a quarta parede. O que torna o filme ainda mais hilário quando colocado em perspectiva com o artificialismo lúdico dos cenários, com árvores, sois, luas e animais fofinhos de papel e pano, acenando para uma inocência completamente arruinada.

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