Diante do atual cenário de pandemia, é no mínimo comovente revisitar uma obra que se proponha a estabelecer conexões entre vidas interplanetárias com tamanha coragem e ausência de cinismo. Do plano de abertura, no qual o lançamento de um foguete espacial se confunde na imagem com uma brincadeira infantil, até o plano final que repete o mesmo movimento, quando Gary Sinise realiza o sonho de retornar da jornada espacial cruzando a imensidão do universo em um foguete misterioso, Missão: Marte é uma aventura de ritmo cadenciado, delicada e humanista, com uma predisposição ao drama rara para uma ficção-científica dessa natureza – bela sessão dupla com o maravilhoso Ad Astra, filme refutado em alguns meios por razões semelhantes.
De Palma encontra humanidade nos conflitos individuais de cada personagem e os conecta a uma jornada exploratória em busca de um sentido existencial coletivo. Sonhos infantis; o medo do desconhecido; o luto e a dor da perda; a memória; a passagem do tempo; a solidão; a amizade; a responsabilidade com o trabalho; a decisão de sacrificar a própria vida para preservar a vida da pessoa amada, mesmo com o olhar desse amor como testemunha; a matéria humana se tornando poeira espacial e se integrando à vastidão do universo; a hipótese de o colonizador espacial se descobrir, ele próprio, um ser colonizado. “O universo não é caos, é conexão”. Missão: Marte pode ter acabado com a carreira de De Palma em Hollywood, mas isso diz muito mais sobre a Hollywood dos anos 2000 do que sobre o filme.